Atlântico Expresso – Qual a importância do Dia Mundial das Competências dos Jovens para o Núcleo de Investigação e Intervenções Terapêuticas Especializadas?

Rafael Teixeira (Psicólogo no NIITE)– O Dia Mundial das Competências dos Jovens para o Núcleo de Investigação e Intervenções Terapêuticas Especializadas (NIITE) é sinónimo de celebração e reconhecimento do “melhor dos dois mundos”. O Mundo dos Jovens e o Mundo das Competências, ambos foco de atenção clínica, evolução e estabilidade no NIITE, que pretende assumir-se cada vez mais como um espaço e tempo ótimos de autoconhecimento, treino, compreensão e expressão do potencial e das competências do jovem na singularidade do seu contexto real de vida e mapa psicossocial

Quem são e o que querem os jovens de hoje? Já parou para pensar nas questões abertas: “quem sou eu?” ou “o que verdadeiramente quero?” São questões de difícil resposta e, certamente, pouco automáticas, pois obrigam-nos a um exame complexo do “Eu” através de um balanço entre todas as nossas caraterísticas pessoais e as particularidades da realidade ecológica onde estamos inseridos. Curiosamente, a adolescência é uma fase marcada por um esforço consciente dos jovens em responder à questão: “quem sou eu”, ao mesmo tempo que vivem com a tarefa de responder a uma caraterística evolutiva muito exigente, que é a puberdade. A crise típica de desenvolvimento dos jovens entre os 12 e 18 anos é o da identidade versus confusão de papéis. Por isso, “o que querem os jovens de hoje?” Querem sobretudo explorar diferentes possibilidades de ser, estar ou pensar, experimentar vários papéis e comportamentos na relação consigo e com os outros. Então, “quem são os jovens de hoje?” São o resultado das suas explorações cognitivas, emocionais, sociais e comportamentais ao longo da vivência única e irrepetível do período da adolescência (e não só)!

Quais são os sonhos dos jovens actualmente? A formação universitária e o primeiro emprego, que eram aspirações importantes para as gerações anteriores, ainda fazem parte das ambições dos jovens de hoje?

O desejo de alcançar a autonomia e a independência são aspirações importantes para os jovens. O investimento na formação académica e a expectativa de entrada no mercado de trabalho são movimentos protectores deste mesmo processo de autonomização. Sim! A formação académica e o primeiro emprego continuam a ser aspirações muito valorizadas, no entanto a sensação de progressão na vida parece já não estar tão ligada ao cargo profissional e à compensação financeira. Hoje, novos sonhos emergem, como por exemplo, arriscar, ter a oportunidade e fazer algo que verdadeiramente gostam, valorizar o gozo de uma melhor saúde física e mental, ter mais tempo para si e para desfrutar dos seus interesses e prazeres, experimentar novas rotinas, estilos e hábitos de vida, trabalhar remotamente ou construir um negócio digital. Nos dias dia de hoje, verificamos um aumento da autoconsciência e da autorrealização nos jovens que estão cada vez mais conscientes do seu lugar no ambiente e, por isso, também temos vindo a assistir a um aumento da “rebeldia adolescente”, frequentemente apontada como um sinal de luta adaptativa pela afirmação da sua autonomia e do seu lugar no mundo.

Podemos afirmar que as instituições, começando pela família e pela escola, têm dificuldades em compreender o jovem de hoje, que necessita de segurança e apoio, mas que também precisa de liberdade para explorar e conquistar a sua independência?

Compreender o jovem de hoje a partir de um olhar exclusivamente “adulto e multigeracional” pode ser uma tarefa difícil, estando potencialmente enviesada. Quantas vezes já ouviram: “no meu tempo é que era bom…”. O saudosismo é natural nas várias gerações. Daqui a uns tempos, seremos nós a ter saudades do nosso tempo. Aumentámos a conflitualidade com os jovens quando tentámos guiá-los ex- clusivamente pelo mapa dos adultos. Eu não sinto que as instituições tenham dificuldades em compreender o jovem de hoje, mas denoto uma redução da compreensão empática na re- lação com os jovens. Atualmente parece que os adultos esqueceram a sua própria juventude. Compreender empaticamente o jovem é fundamental para a redução das suas dificuldades e, para tal, é necessário recuar à nossa história pessoal e emocional passada para encontrar pontos de identificação com ele, reconhecer a nossa experiência emocional e a do outro, identificar e comunicar o que estamos a ver e a sentir sem julgamento e estar genuinamente disponível para escutar ativamente o jovem dentro do seu tempo e espaço.

Na sua opinião, a escola é atualmente um refúgio ou um espaço de tensão e frustração para os jovens? O que esperam os jovens da escola e o que realmente a escola lhes oferece?

A escola pode constituir um espaço de aprendizagem conceptual, social e prática muito importante e pode ser um porto seguro de destino, um espaço de tensão, desilusão e frustração, o local do primeiro amor ou do primeiro beijo, dos “amigos para a vida toda”, uma oportunidade de exploração vocacional ou de desenvolvimento de carreira profissional, um contexto de estímulo à aprendizagem e capacidade intelectual ou o cais de embarque para o futuro. Os jovens esperam que a escola lhes forneça uma vantagem competitiva face às possibilidades, exigências e imprevisibilidades futuras. As abordagens e currículos escolares one size fits all tendem a limitar a liberdade e a criatividade das suas explorações identitárias e podem ter um impacto negativo direto sobre o seu desenvolvimento no futuro, gerando maior tensão e frustração. Em contrapartida, a escola pode oferecer uma maior diretividade sobre o percurso académico do jovem, aumentando a sua autodirecção para o cumprimento de diversos objectivos de aprendizagem sumativos e formativos, bem como promover uma maior previsibilidade e estruturação das suas rotinas ocupacionais que são muito protectoras da saúde mental.

Até que ponto as Tecnologias de Informação e Comunicação aproximam ou afastam os jovens? Que impacto têm essas tecnologias no processo de transição para a vida adulta numa sociedade considerada globalizada?

Curiosamente, as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) têm, simultaneamente, o efeito de “aproximar”, mas também de “afastar” os jovens e não só, pois isto tendencialmente está a estender-se por todas as faixas etárias. O que nós sabemos é que o aumento da acessibilidade ao outro, através de ecrãs, não está a reduzir os índices de solidão, pelo contrário, esta é cada vez maior. As TIC promovem um aumento da privação social e, por isso, afastam, pois reduzem o tempo de qualidade das interações in vivo. O cérebro humano não reconhece como interacção as horas passadas em frente ao ecrã, pois falta a riqueza sensorial e o seu impacto pode ser muito variado. A utilização excessiva das TIC pode prejudicar a quantidade e qualidade do sono, aumentar a solidão, a dependência, fragmentar a nossa atenção, reduzir a produtividade, a satisfação com a vida ou contribuir para o desenvolvimento de estados de ansiedade e depressão. Por outro lado, as TIC aumentam a rapidez, a eficiência e a simplicidade das nossas trocas comunicacionais, optimizando resultados. Numa sociedade tão globalizada, veloz e ávida por sucesso e excelência, a utilização das TIC é indispensável no processo de transição do jovem para a vida adulta. As TIC são cada vez mais uma extensão de nós – é difícil viver sem elas –, mas importa promover a redução do seu tempo de utilização nos mais jovens através de aplicações de controlo de tempo de ecrã, da desactivação de notificações, do estabelecimento de horários sem tecnologias e priorização de actividades ao ar livre e de interação social ao vivo com pessoas, lugares ou objectos significativos, num esforço mais ou menos equilibrado entre a naturalidade do ser humano e a artificialidade das TIC.

Como o NIITE tem contribuído para o desenvolvimento das competências dos jovens nos Açores e como os ajuda a identificar e desenvolver essas competências?

O NIITE é uma clínica especializada nas áreas do desenvolvimento, saúde mental e bem-estar psicossociofamiliar de crianças, adolescentes e respectivas famílias. O desenvolvimento das competências dos jovens é obtido através de um trabalho multidisciplinar de avaliação e intervenção a partir de dife- rentes valências (pedopsiquiatria, psicologia, terapia da fala, psicomotricidade, terapia ocupacional e musicoterapia), com profissionais especializados e devidamente qualificados, mas também a partir de metodologias de in- tervenção específicas, como por exemplo a aplicação de Análise Comportamental Aplica- da (ABA), Modelos DirFloortime, Denver de Intervenção Precoce ou PECS para promoção de competências de comunicação, habilidades sociais, cognitivas, motoras e funcionais relativas ao desempenho de actividades de vida diária. Adicionalmente, o NIITE tem vindo a desenvolver um conjunto de programas de intervenção em grupo com base no Modelo SEL (Social and Emotional Learning) com o objectivo de promover o desenvolvimento integrado e interrelacionado de competências agrupadas numa estrutura de cinco grandes domínios de intervenção com os jovens, nomeadamente o seu autoconhecimento, autogestão, consciência social, relação interpessoal e tomada de decisão responsável. O Projeto RIR (Resiliência I Identidade I Relações Interpessoais), o Programa SPEAK (Strong I Personal I Empowerment I Achieves I Knowledge) ou as oficinas terapêuticas MindMoving e Being(A)Part aplicadas em contexto educativo junto de alunos do 3º ciclo do ensino básico, ensino secundário e superior, são os nossos melhores exemplos. Bem como o Brinca e Lê, um programa de estimulação de pré-requisitos para a leitura e escrita de crianças em idade pré-escolar.

Como o NIITE avalia a eficácia dos seus programas e intervenções?

Recorremos tipicamente a uma avaliação pré (antes da intervenção) e pós-teste (no final da intervenção) e executámos estudos de follow-up a partir de instrumentos clínicos de avaliação e/ou investigação, a múltiplos informadores, validados para a população portuguesa e, em momentos específicos no tempo, também recorremos a análises comparativas de indicadores sumativos e formativos do sucesso educativo, pedidos de feedback ou outros indicadores qualitativos considerados relevantes para o efeito. Um dos nossos pro- gramas de intervenção em contexto educativo, o Projeto RIR, após dois períodos letivos de implementação com alunos do 3º ciclo do ensino básico de uma escola da ilha de São Miguel, contribuiu para uma redução significativa da presença de problemas do comportamento. Em comparação com o ano letivo anterior (2022/23), evoluímos positivamente de 55 para 17 medidas disciplinares aplicadas, observámos uma redução do nível de severidade de sintomas de ansiedade e depressão em dois alunos/as e registámos um aumento da procura de apoio individualizado e do envolvimento familiar e escolar. Avaliar a eficácia dos nossos programas e intervenções é crucial para garantir a melhoria contínua dos nossos serviços pró-saúde mental e bem-estar, aumentar a acessibilidade e relação custo-efectividade dos nossos serviços e promover a máxima melhoria sintomática dos nossos clientes.

Quais são as competências mais valorizadas atualmente no mercado de trabalho para jovens?

As hard skills ou aptidões técnicas profissionais adquiridas através da formação académica, técnica ou prática continuam a ser muito valorizadas no mercado de trabalho para jovens. O domínio e conhecimento de diferentes línguas estrangeiras, a obtenção de um curso ou grau académico valorizado e diferenciador no mercado de trabalho, o desenvolvimento avançado de habilidades ligadas à informática ou a aquisição de uma habilidade muito específica na operação de uma máquina, modelo de intervenção, público ou ferramenta de trabalho são competências muito valiosas. Combinar estas habilidades com as chamadas soft skills, isto é, as habilidades de nível cognitivo, emocional e comportamental de carácter mais pessoal, como por exemplo, a capacidade de comunicação interpessoal, a assertividade, empatia e definição de limites claros e consistentes, a proactividade, o senso de liderança, do autoemprego e da autorresponsabilização, a capacidade de resolução de conflitos, extroversão e a conscienciosidade podem constituir um cocktail de competências forte, colorido, muito apetecível e facilitador da entrada dos mais jovens no mercado de trabalho.

Que desafios enfrentam os jovens hoje em dia no desenvolvimento das suas competências?

Hoje em dia, assiste-se a um aumento da exigência sobre o “belo”, o “sucesso”, a “excelência” e o “ser bom a todo o momento”, mas no menor tempo possível e, muitas vezes, numa lógica de sobre generalização de recursos e competências pessoais e sociais (o chamado “pau” para toda a obra). Parece que temos de ser muito bons, muito rápidos e económicos em muitas áreas ao mesmo tempo. Prevê-se que o Monumento da Sagrada Família, em Barcelona, possa estar concluído em 2026, no entanto há trabalhos que se podem prolongar até 2034, nomeadamente, detalhes nas esculturas e outros pormenores decorativos. De facto, o “belo” e o “admirável” exigem tempo e espaço para o desenvolvimento e expressão do seu potencial máximo, assim como as competências dos mais jovens. Diria que um dos principais desafios que enfrentam no desenvolvimento das suas competências está na tentativa de equilibrar a relação entre o aperfeiçoamento contínuo das suas habilidades, a exigência sobre o custo-efetividade do manancial de tarefas solicitadas e o aumento do investimento na quantidade e qualidade do seu próprio autocuidado ao longo do tempo.

Quais são os planos futuros do NIITE para melhorar o desenvolvimento das competências dos jovens?

A aposta em programas de intervenção assentes numa parceria de colaboração multinível e ecológica entre as escolas, as famílias e os recursos e serviços da comunidade têm gerado resultados muito positivos no desenvolvimento das competências dos jovens. Assim, os planos futuros do NIITE passam por reforçar e aumentar a ecologia das nossas respostas terapêuticas especializadas, individuais e em grupo, de modo a promover um exame e tratamentos clínicos cada vez mais compreensivos e integrados em temáticas relativas à saúde mental de crianças, jovens, adultos, famílias e outros agentes educativos. Psicoeducar e capacitar a comunidade, na qualidade de agentes de mudança, para a mobilização de estratégias reflexivas pró-saúde mental nos domínios da comunicação, da relação e da gestão emocional e comportamental com os jovens, através de diversas formações, campanhas de sensibilização ou intervenções terapêuticas focalizadas e costuradas à medida das necessidades da pessoa também é uma das nossas principais prioridades.

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